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Sobre o que escrever

Rodolfo de Souza
11/09/2025 | 09:01
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FOTO: Gilmar | DGABC Diário do Grande ABC - Notícias e informações do Grande ABC: Santo André, São Bernardo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra


Não consigo ver uma página em branco sem deitar nela algumas palavras, qualquer que seja o assunto. Sou mesmo incapaz de resistir a esse chamado de que tanta gente duvida da importância.

Um dia, aliás, fui abordado por alguém que indagava a respeito da quantidade de temas que devem pairar na cabeça de um cronista para que este possa desenhar um bocado de textos, todos de contornos diferentes e formatos variados, concebidos antes em sua mente e colocados, com capricho, no papel para, enfim, servir ao ávido leitor.

Mas não é possível que haja tanto sobre o que escrever semanas a fio – questionou ainda o inconformado interlocutor.

Fatos e mais fatos, contudo, fustigam nossa cara dia a dia, isso é de entendimento geral. Do que falar, sem dúvida, sempre há. A questão é como abordar cada tema, somente isso. Evidente que não pretendo aqui estender-me numa aula de produção textual, principalmente, do gênero sobre o qual tenho me debruçado por anos.

Mas, por vezes, me pego acometido por profundo desalento diante de tantos fatos dignos de inspiração para centenas de textos. Normalmente aporrinhações oriundas da degeneração do espírito humano, mais do que nunca, de posse do poder daqui e do mundo. Claro, porque se há uma guerra ou simplesmente um massacre de pessoas é porque mentes podres determinaram que era momento de dar asas ao ódio e mover peças humanas num tabuleiro para que matem ou para que morram, num jogo em que não há vencedores. 

É possível não falar disso?

Tentam alguns, nesta terra de meu Deus, aprovar com urgência o projeto do “liberou geral”, o projeto da patifaria autorizada que dará ao criminoso o direito de praticar delitos sem ser molestado, tudo na forma da lei. É a maneira encontrada para se impedir que se faça justiça neste país.

E vem a pergunta: como posso testemunhar o hediondo sem escrever sobre ele, sem comentar seus arroubos?

No dia da independência, dia tão importante para esta nação, houve desfiles de gente que comemorou a liberdade. Mas houve também aqueles que se manifestaram pedindo a contra-independência, num movimento que pede a outra nação estrangeira que tome de assalto nosso território e faça dele o que quiser. É a mesma parcela da população que, não vai muito longe, pediu um golpe de estado e a volta do AI-5, sem saber exatamente do que se tratou o ato. 

Como ver tamanho disparate sem falar a respeito é a pergunta.

Mais ao norte, o grande líder vê derreter o poderio do seu império a olhos vistos. Vê, com indiferença, sua economia descer pelo ralo e sua gente começar a estender o chapéu. Assiste à derrocada de sua supremacia diante das demais nações do mundo. Mesmo assim, insiste em ameaçar, em mostrar a boca banguela para amedrontar os demais poderes que já não o temem como temeram um dia.

Como, então, presenciar tal fenômeno sem comentá-lo?

O cronista de antigamente contava histórias de sua infância, falava de bondes e de fatos corriqueiros transcorridos numa época em que a tecnologia não dava as cartas como hoje. 

Na modernidade, no entanto, em que a demência conseguiu subir ao ponto mais alto do pódio, o que fazer senão escrever a respeito, deixando de lado a poesia dos velhos tempos que não se encaixa exatamente numa crônica como esta?




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